Há algum tempo que andava para escrever algo deste género, mas não sabia bem por onde começar… tinha a ideia do título “O Triunfo da Estupidez”, mas pareceu-me demasiado óbvio e pouco útil.
“Agarrem-se bem”, parece-me ligeiramente mais humilde e talvez sirva como algo que eu possa recordar daqui a uns anos, acompanhado de um “eu bem disse para se agarrerem bem…”
2020 há-de ser um ano recordado pela sua infâmia. Mesmo que 2021 venha a ser muito pior, ou que daqui a 10 anos estejamos debaixo de furacões de fogo, com híbridos de tubarão e crocodilo que deitam lasers pelos olhos, no centro… 2020 será sempre o ano em que calhou tanto cocó, que já não há forma de não ser visto, no mínimo, como o início de um mau bocado.
Mas nem tudo nasce aqui. As coisas têm vindo a precipitar-se para o poço da imbecilidade, em aceleração terminal, há uns anos. Podemos, talvez, culpar a Internet. Assim, de uma forma genérica e sem entrar em detalhes de se é este serviço, ou aquela plataforma. Mas a Internet não faz de ninguém estúpido — os estúpidos já andavam aí; simplesmente, agora têm formas muito mais eficazes de comunicar com outros estúpidos.
Quando estas abéculas comunicam umas com as outras, a sua idiotice cresce, exponencialmente. Começam a ganhar cada vez mais expressão e tornam-se alvos preferenciais de certa retórica política. Estas pessoas, de ideias básicas, mas inamovíveis, aproximam-se cada vez mais do poder nas suas várias expressões.
Veja-se, tão simplesmente, a pessoa que neste momento detém o poder sobre o principal arsenal nuclear no planeta: um verdadeiro lerdo. E não há propriamente forma de dar a volta a isto. O homem é um lorpa. Autoritário? Sem dúvida. Amante de ideias totalitárias? Não questiono. Mas, por exemplo, compará-lo com Hitler seria um insulto… para Hitler.
No passado, o mundo pertenceu a pessoas com vontades e, muitas vezes, punhos férreos. Alguns mais civilizados, outros, verdadeiramente maléficos, mas raramente a História nos fala de um burro. Loucos, imensos, idiotas… nem tanto.
Mas cá estamos. Grunhos por todo o lado, com cada vez mais voz, mais insanidade pública e mais adeptos. À volta desta gente, há sempre matilhas de gajos mais espertos, sempre í espera de colher os restos do caos que vão lançando. E assim vamos balançando, entre a enorme falta de pensameto crítico de uns e a perfídia de outros.
A civilização Humana está num nível razoavelmente avançado. Os últimos cento e muitos anos trouxeram-nos um salto tecno-científico que nos permite diariamente fazer coisas que, a cada década, se tornam quase magia para a geração anterior. E no entanto, este desenvolvimento co-existe com um crescimento aparente do número de pessoas que acreditam que a Terra é plana.
Claro que não há nada de errado com ser um bocadinho totó. Mas houve uma altura na nossa História em que decidimos que a razão era mais importante que tudo o resto — não que se tenha eliminado tantas outras coisas importantes para a Humanidade — mas sempre com a noção de que as coisas que nos regem, são para ser estudadas, medidas, comparadas e registadas; sem esquecer que devem ser questionadas, da mesma forma; podendo ser alteradas, caso novos estudos, medições e experiências venham a justificá-lo.
Agora, em 2020, para muitas pessoas, “li no Facebook”, é justificação suficiente, para se acreditar em coisas sem qualquer demonstração, confirmação ou prova. Aliás, mesmo na face da evidência, como o facto de durante décadas e décadas de prática, cirurgiões de todo o mundo não morrerem de horas e horas de trabalho usando máscara cirúrgica, muita gente prefere acreditar num texto cuja origem desconhece, cuja intenção desconhece, cuja informação contraria aquilo que pode ser facilmente observado.
Podem haver muitas justificações para isto, mas custa-me muito a crer que a maior de todas não seja burrice. E enquanto poderia ser aceitável acharmos que estamos a salvo dos burros, o mesmo já não poderemos dizer daqueles que esfregam as mãos de contentes com a facilidade com que os conseguem controlar para os seus próprios fins.
Por isso é que eu digo, agarrem-se bem. Cada vez mais acho que isto vai abanar e vai abanar bastante. Seja por onde for: desestabilização ainda maior do Estados Unidos que, queiramos ou não, tem um poder enorme no resto do mundo; crise climática cada vez mais grave, porque continuamos a ter pessoas que perante o tornado de lava radioactiva continuará a afirmar que nada disso existe e que “isto é normal para a época do ano”; ou extremismo político por toda a Europa — por todo o mundo — conduzido por uma data de zarolhos em terra de cegos.
Há muitos pontos de ruptura possível para a nossa civilização. E talvez tenha chegado a nossa altura. No fundo, a possibilidade da nossa extinção faz parte do modelo de Enrico Fermi. Quem sabe se não é um dos grandes filtros e não há nada a fazer?
Mas embora o potencial para nos auto-destruirmos possa fazer parte do nosso ADN, sempre me ocorreu que o mesmo viesse a concretizar-se por via da crueldade humana. Afinal, começo a desconfiar que virá pela mão de um imbecil.
This one goes out in English because I wrote it in English and I don’t feel like translating.
So I’m flying out on one of my frequent work trips and my belly is a little “not well”, but let’s say it’s not terrible, so l feel confident and board the plane without visiting the porcelain throne. I take my seat and buckle up and it starts to become clear that things are going to get worse much faster than I had anticipated.
Now we’re taxiing to the runway and I’m already farting quite badly, but even that isn’t reducing the pressure within my bowel, things are about to get very ugly. I think to myself that all I need to do is wait for take off, and when the plane levels off, I’ll run to the toilet.
As we hit the end of the runway and pull up, I’m already in serious pain, I’m sweating and starting to get a bit nauseated from the whole thing. We climb, and for some reason, the climb seems infinite, maybe because I’m about to shit my pants. The whole time, my brain is going a million miles an hour, trying to control my sphincter and calm myself down until I get a chance to get up and go to the bathroom. None of which is working.
I finally give in to reality, I unbuckle, stand up and walk down the inclined aisle, to the back of the craft. I tell the flight assistant, still strapped to her seat, that I need her to unlock the bathroom for me. She says I’m going to have to go back to my seat and wait, the take off is a bit turbulent, and no one should be walking around. I look deep into her soul, through her eyes and she immediately understands. There is something in humans that makes us sympathetic to one another, when we realize one of us is about to explode into a million pieces of faeces.
She quickly unlocks the bathroom, I get in, strip my pants, sit and unload. I let out a sigh of relief, together with a truly astounding mountain of shit. I can barely breathe from the foul stench, I seem to have brought on board. I don’t know what happened in my digestive system, but I sure am glad to be rid of it.
I wipe, stand, and flush.
And this is when my ordeal starts.
The poop. The gigantic pile of badly formed, horribly stinky, and viscous poop isn’t flushing. Now, if you’ve seen airplane toilets, you know it feels like they could flush you out, if you’re not careful, so you can imagine my panic when the muddy substance I had just released didn’t get vacuumed out immediately.
I think to myself that it must be because the lid is open, so I close it and hit the button. Nothing. I open it and my shit is staring me in the face, defiantly. I feel out of options. I can’t just leave it like this, the smell is unbelievable, and everyone will know it was me. This is going to be the most awkward flight of my entire career. I try a couple of times more, cupping water into my hand and throwing it in, to see if I can dissolve anything. It does not work, that thing is like the Mount Doom of turds.
Finally, it becomes clear what I need to do. I do not want to do it, but I must: I need to use my hands.
I take a few paper towels, thank Zeus I didn’t have to do it barehand, I lean in, trying not to breathe, and I push the hell-spawn that is my own defecation down, closer to the hole, hoping to finally eject it.
For good luck, I close the lid. I press the button and after a few seconds of strange noises, I finally hear it, the satisfying “wuooomppff” of an airplane vacuum toilet flush. It takes a few more operations to be completely rid of it all, but I manage.
I compose myself, wash my hands and leave the bathroom trying to pretend I didn’t just spend ten minutes in there fighting the Dark Lord of the Shits, that I myself had created.
Os Tool são uma daquelas bandas imperscrutáveis que parecem tocar pessoas diferentes de formas diferentes. Se, para uns, são uma banda de metal, para outros estão longe disso. Se há quem lhes chame simplesmente rock, há quem lhes acrescente o progressivo. Metal progressivo? Herdeiros de quê, afinal? Yes, King Crimson, Pink Floyd, Rush? Ou Melvins? Faith no More, Jane’s Addiction?
Possivelmente todos. E mais alguns. E é isso que faz da música dos Tool algo tão simultaneamente familiar, mas invulgar. É porque quando se é um músico deste calibre, como Adam Jones, Danny Carey, Justin Chacellor e Maynard James Keenan, não se deixa levar por convenções e caixinhas onde só cabem gostos limitados de pessoas limitadas.
A cultura musical extensa dos membros da banda está patente na música que produzem, assim como se fazem sentir as suas personalidades e sensibilidades diversas. Da arte visual, í exploração sónica, ao famoso vinho do Arizona.
Não apanhei os Tool no início. Foram-me apresentados mais tarde na penumbra de um estranho restaurante italiano, no lobby de um hotel agora defunto, na Filipe Folque. Ao longo dos anos, fui desenrolando a meada de riffs, poliritmos e poemas melancólicos que fazem Undertow (1993), í†nima (1996), Lateralus (2001) e 10,000 Days (2006).
Com uma média de 4 anos entre álbuns, a banda calou-se, subitamente, durante mais de uma década, para finalmente lançar “Fear Inoculum” em 2019. Embora existam muitas músicas da banda que estão entre as minhas preferidas de todos os tempos, como Schism, Jambi, The Grudge, The Pot, ou í†nima, este último álbum, como peça única, é o melhor álbum de Tool até í data.
Não que espere que produzam outro, talvez não seja boa ideia. Pelo menos não nos próximos 10 anos. Mas se 10,000 dias eram os 27 anos que levamos a crescer e começar a perceber que vida é a nossa, que pessoa somos, Fear Inoculum é a Ode Aos Homens Maduros. Com 46 anos, uma década menos que a média de idades dos membros da banda (só o Justin Chancellor é que tem 47), este disco fala ao mais íntimo do meu ser. A inoculação do medo — de morrer e de viver — a capacidade de enfrentar a realidade tal como ela me parece ser e não como desejo que seja, sem exercíciozecos fúteis de gratidão e saudação ao sol, mas com a cara descoberta e de frente para a chuva e o vento que cortam a fantasia de uma vida inventada.
Desde as primeiras audições que comecei a perceber que havia um pathos nesta música que parecia colar-se ao meu corpo e entranhar-se, pelas meninges, até í s curvas incompreensíveis da masa cinzenta. Esta coisa inexplicável de sermos como somos. Aceitar que esta merda é um caos do caralho e que não vale a pena fingirmos que vivemos mais do que uma fracção de segundo, ou que compreendemos seja o que for do que nos rodeia muito mais distante do que uns milhares de quilómetros.
Como é que um gajo vive mais de meio século e lhe parece tanto e tão pouco? Quando é que as “manias dos miúdos” começam a ser simplesmente a nova norma, das novas gerações, aquilo que nos substituirá? E o que ainda temos para contribuir para este mundo, que não passe por patético? Que luta ainda é valiosa? Para cada um de nós e para o colectivo?
Seja como for, a verdade é que podemos enfrentar tudo isto com o brilho nos olhos de um ser vivo que consegue ser e não ser, simultaneamente e, perante um Universo absolutamente incompreensível, conseguimos dizer que afinal percebemos tudo. Vivemos e morremos ignorantes, mas sempre que um de nós se levanta e dá os primeiros passos, é como se todos nos erguessemos com a intenção de levar a bandeira da existência — e não a mera vida — um espaço-tempo mais í frente.
Sound the dread alarm Through our primal body Sound the reveille To be or not to be Rise Stay the grand finale Stay the reading of our swan song and epilogue One drive to stay alive It's elementary Muster every fiber Mobilize Stay alive ("Descending")
A proeza deste álbum é que faz tudo isto com as letras, a voz, os instrumentos, a música, o ritmo, o som. Tudo é uma espécie de uníssono, simultaneamente pesadíssimo e etéreo. A execução é a que se espera de músicos que sempre estiveram acima da média e que têm do seu lado o benefício da experiência; a produção (da banda) é monstruosa e absolutamente infalível. Só com um domínio total do estilo, da teoria e prática da música e dos métodos de gravação, mistura e masterização se conseguem transformar coisas simples, uma guitarra, um baixo e uma bateria numa espécie de terramoto avassalador que, afinal, parece ser apaziguado com a voz de um homem de 55 anos cuja vida é produzir vinho e que, por acaso, é um dos mais extraordinários vocalistas de rock dos últimos 30 anos.
Calo-me. E deixo que a minha verborreia de pura admiração seja substituída, mais uma vez, pela música de quatro homens maduros.
É isso. Agarrem-se bem, que isto vai piorar. Há algum tempo que andava para escrever algo deste género, mas não sabia bem por onde começar… tinha a ideia do título “O Triunfo da Estupidez”, mas pareceu-me demasiado óbvio e pouco útil. “Agarrem-se bem”, parece-me ligeiramente mais humilde e talvez sirva como algo que eu possa […]
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