Não é particularmente fácil falar do que eu quero falar sem falar de imensas coisas de que não me apetece falar. Digamos portanto que é uma espécie de terreno minado, sendo que as minas estão mais ou menos assinaladas e eu posso saltitar por entre elas, não deixando no entanto de correr o risco de me desequilibrar e cair em cima de uma delas.
No início do mês de Outubro deixei de trabalhar no SAPO e pouco depois, deixei de ser funcionário da PT. Ao fim de 12 anos, demiti-me para aceitar uma nova oportunidade, noutra empresa (já lá vamos).
Doze anos de qualquer coisa é muito tempo de qualquer coisa. Doze anos de vida, de um emprego, de pessoas, de locais, de hábitos e rotinas é mesmo muito tempo. E precisamente por ser tanto tempo, não se pode definir de forma particularmente sintética.
Trabalhar no SAPO não foi uma coisa, foi muitas coisas, foi ser um gajo que fazia uns banners, gravava umas páginas do browser para fazer correcções no código (e tentava não ter muita comichão com isso), foi desenhar sites e aplicações, ícones, logos e ilustrações, escrever código em barda, foi fazer lobby para que a equipa de design deixasse de estar no editorial e passasse para o técnico, foi ajudar as pessoas a integrar-se, a ter melhores oportunidades, a aprender coisas novas, foi fazer cenografia e decoração, desenhar o Codebits, fazer t-shirts e merchandising, foi até cozinhar nuclear tacos e fazer umas boas centenas de pessoas sofrer.
Foi uma série de outras coisas menos boas, como não podia deixar de ser, alguns conflitos com pessoas, frustração com projectos, cansaço, desilusões ocasionais e várias outras coisas que fazem parte de qualquer relação que se tenha na vida, seja pessoal ou profissional.
O SAPO era uma direcção da PT (e ainda é…), e como tal começou aos poucos a ser afectado pela crise que a empresa sofreu nos últimos dois anos. Apesar de termos uma cultura própria e uma espécie de barreira defensiva daquilo a que vulgarmente se chama a PT Profunda, não havia maneira de ficarmos incólumes ao que se passava naquilo que era, de facto, a nossa empresa.
Mas eu não vou aprofundar-me em pormenores obscenos sobre o que se passou e continua a passar na PT, porque não sou esse tipo de gajo e também porque quando eu senti que o nível de conforto tinha descido o suficiente para mim, fiz o que achei que devia fazer e saí. Também não me armo em herói, saí porque me surgiu uma excelente oportunidade na altura certa.
Enter Kwamecorp
Numa série de coincidências simpáticas (em que o Facebook foi instrumental), re-encontrei-me com um velho amigo que já não via há anos. Bebemos umas imperiais e conversámos sobre o passado e o presente, o trabalho, as empresas e as famílias. Ele, designer, actualmente na Kwamecorp, um colectivo de designers e engenheiros com escritórios em várias cidades, equipa em Lisboa e vários projectos e clientes de peso; eu, na PT com um outlook algo cinzento.
Apenas alguns dias depois, surgiu o convite para fazer umas entrevistas. Já tendo recusado algumas oportunidades ao longo dos anos, precisamente por estar bem onde estava, desta vez senti que era algo completamente diferente: não só eu já não me sentia bem onde estava, como a KC me parecia uma empresa de excepção para trabalhar. Fiz as entrevistas, que correram muito bem e o resto é um bocadinho desta história que ainda está no início.
No dia 2 de Novembro comecei a trabalhar na Kwamecorp. O meu primeiro dia começou í s 4 da manhã, hora a que acordei para me preparar, pegar na mala e partir para o aeroporto de Lisboa. Viagem para Munique, depois para Zurique, uma semana de user testing de um projecto que depois seguiu, connosco, para Palo Alto, para uma semana de sessões de trabalho, wrap-up e entrega. Passei duas semanas em viagem, a absorver o novo trabalho, aprender nova metodologia, conhecer novos colegas e a ajudar no que podia.
Foi a chamada entrada a pés juntos.
Entretanto já estou em Lisboa, a trabalhar no escritório da Rua Garrett, num espaço porreiro, cheio de pessoas completamente doidas. Mesmo o meu tipo. O trabalho é bestial, a cultura da empresa é genuína e infecciosa e acordo todas as manhãs com vontade de vir para o trabalho. Com jet lag, todo fornicado dos cornos, mas com vontade de vir para o trabalho.
Com 42 anos e depois de 12 anos na mesma empresa, esta foi uma mudança significativa na minha vida profissional e agora que a abracei, tudo parece renovado, do trabalho no dia a dia, até í simples deslocação, com o regresso í s viagens de cacilheiro e ao ambiente do Chiado.
A vários níveis, agora parece-me claro que estava mesmo a precisar de algo assim. Não sei exactamente o que vai acontecer a seguir, mas sei que vou estar com atenção para ver. Aqui fica ao início de um novo capítulo e í curiosidade sobre o que se passará nos próximos 12 anos.
Debates eleitorais com migrantes a cavalo a tourear, enquanto perseguidos por ciganos em bicicletas que não páram em semáforos, perante uma audiência de 50% taxistas e 50% condutores da Uber, em que o prémio final era uma noite com vinte refugiados Sírios com a garantia de que pelo menos 10% são terroristas infiltrados desde que, no fim, emergisse finalmente o veredicto de qual é o melhor gin para combinar com hamburgers artesanais de assinatura, tudo comentado pelo José Sócrates comendo fatias de pizza de pepperoni, enquanto a Joana Amaral Dias lhe conta o dinheiro, toda nua, acabando por parir em directo da CMTV, com as câmaras registando a reacção de Paulo Portas í episiotomia executada habilmente pelo Jorge Jesus que afinal é obstetra transsexual casado com um ornitorrinco de extrema-direita.
Quando o Tiago nasceu, refiz o blog. Na altura, tinha um tema a puxar para o construtivismo soviético, um layout de três colunas, tudo muito confuso e desactualizado em termos do que a web era na altura.
Sentei-me no sofá da sala nos momentos em que o meu filho dormia placidamente na espreguiçadeira í minha frente e refiz o template de WordPress todo. O novo tema chamou-se Helveticus, era simples, despojado e ficou com a promessa suspensa de vir a ter umas ilustrações que imaginei na altura mas que nunca fiz.
Passaram-se oito anos, muita coisa mudou na minha vida, na web, no meu trabalho. O site estava desactualizado, eu já não me revia numa coisa tão minimalista, tinha saudades do sabor a CCCP do meu template antigo e já não escrevia código há uns tempos valentes. Também estou, confesso, cansado desta web bonitinha que temos. É tudo lindo, com imagens estupendas, blocos direitinhos e alinhados, tudo muito bem pensado, planeado e implementado. De tal maneira que em muitos casos se perde o gozo, se perde a essência, um certo cambalear típico dos miúdos que parece que se vão desmanchar todos, mas acabam por dar dois passos e nós ficamos com os olhos a brilhar. Sim, estou a ficar mais velho e mais saudosista, sue me.
Juntei então todas as minhas pequenas frustrações e comecei a redesenhar o blog, aos bocadinhos, para responder í quilo que eu sentia que me apetecia ver e usar. Aproveitei para voltar a pegar em código, para experimentar (finalmente), SASS, para usar o Ink e para de uma vez por todas devolver o gozo aqui ao já vetusto estabelecimento.
Trabalhar com o Ink foi um descanso e é tão simples e intuitivo que só um macaco morto seria incapaz de o utilizar com rapidez e eficiência. De resto, o Ink veio potenciar a minha forma usual de trabalhar o blog, que é por pura improvisação: agora isto, agora aquilo, experimento aqui, mudo ali e a coisa vai-se compondo aos poucos.
Portanto, não esperem uma coisa bonita e refinada, bem pensada e sem falhas. Mas sim uma coisa que, antes de mais, devolve o Macacos Sem Galho a uma estética que ostentou durante anos e que me agrada í brava e que nasceu sobretuto de um projecto de gozo pessoal.
Nada disto implica que eu não queira que as coisas funcionem como deve ser pelo que, se derem por bugs e cenas partidas, não hesitem em avisar. Fiz a coisa para correr em três larguras de ecrã e tentei não ser demasiado rígido com espaços, larguras e alinhamentos. No entanto, claro, por favor não me chateiem com problemas de Internet Explorer, façam simplesmente um favor a vocês próprios e mudem de browser. Chrome ou Firefox servem perfeitamente.
Alterei também ligeiramente a publicidade, porque, convenhamos, esta merda não me dá um tostão e era porreiro que pelo menos me pagasse o domínio, caso contrário, mais vale não ter nada. Portanto, agora há um banner maior e banners adaptados para as várias larguras de ecrã e vou ver se a coisa melhora. Se não melhorar, é possível que simplesmente desista.
E pronto, não há muito mais história a contar. Este é o Macacos Sem Galho, começou em Março de 1999 e ainda aqui está, agora com 120% mais UX, quase inteiramente responsive e multiplataforma, baseado em extensa user research (mostrei í minha mulher) e completamente disruptivo. Agradeço sinceramente a todos os que, ao longo dos anos, por aqui têm passado e de uma forma especialmente carinhosa aos que ainda cá vêm com alguma regularidade, até mesmo aos trolls. Isto é o que é, porque há pessoas desse lado.
Dou então assim inaugurado o novo tema deste blog, de seu título Constructivist Ape. Que a produtividade do proletariado chova sobre todos nós em gloriosas gotas de liberdade e igualdade. Viva o comité central! Viva o Povo! Vivam os macacos!
Nos últimos dias de Maio, o SAPO começou a preparar conteúdo especial para a homepage, alusivo ao Dia Internacional da Criança. Enquanto a Isa desenhava o layout do conteúdo para a página (ela é a designer da homepage do SAPO, btw), eu fiquei incumbido de criar o logotipo ilustrado que figuraria em substituição do nosso habitual logo de topo.
Tinha uma ideia simples na cabeça, nada de extraordinariamente original, mas também algo que eu nunca tinha realmente feito. Uma ilustração simples, sem a linha preta de “tinta da china” a que estou mais habituado quando desenho os Especialistas e ainda por cima, um desenho de crianças, algo que me é particularmente difícil de desenhar (pior, só mesmo mulheres, daí ter muito poucas mulheres nas minhas BDs e não por qualquer estranha razão sexista como algumas pessoas pensam).
Afinal, o processo correu muito melhor do que eu esperava e consegui obter o que queria em apenas algumas horas. O desenho foi inteiramente digital, feito no Photoshop, com uma Wacom Cintiq 12WX. Uso sempre brushes do Frenden, a quem comprei o conjunto Pencils & Inks que recomendo vivamente.
Comecei então por esboçar com o lápis azul mais ou menos o que queria, esboço que depois refinei em figuras já concretas, para usar como base.
Para me certificar que tinha uma composição razoável para a palavra SAPO, escrevi-a a azul sobre o esboço vermelho até ficar satisfeito com o ritmo das letras nas camisolas dos miúdos.
Seguiu-se um desenho mais fino a lápis de grafite que acabei por abandonar na versão final, mas que me serviu de guia para a fase seguinte: colorir os bonecos. Tive especial cuidado para manter a ilustração colorida e sobretudo para que a cor da pele das crianças fosse variada, uma vez que o SAPO tem uma audiência ampla e muitas vezes a tendência para desenhar os bonecos todos com o mesmo tom de pele (invariavalmente parecido com o nosso), acaba por ser natural e é precisa uma decisão consciente para não esquecer de representar a multiplicidade de tons que existem í nossa volta.
As feições foram acrescentadas por cima e depois retirei as linhas de lápis para ficar apenas com as manchas de cor, algo que me agradou e decidi manter. No entanto, o contraste era pouco e alguns detalhes como os dedos perderam-se, pelo que acrescentei mais uma passagem de pormenores, sombras e algumas linhas de demarcação de zonas de pouco contraste, a conselho da Dalila e que fizeram muita diferença no resultado final.
Embora a ilustração estivesse praticamente terminada, uma das ideias que tinha na cabeça era a de usar alguma textura. Seleccionei então uma foto de uma aguarela que encontrei na net (gratuita), alterei as cores e adicionei como “soft light” por cima de todo o desenho, com uma máscara para não afectar o fundo branco. O resultado final dá uma tonalidade mais quente a toda a ilustração e acrescenta a tal textura que acho que lhe dá mais riqueza e algo de “natural”, apesar de todo o trabalho ser digital.
A ilustração foi publicada nas várias homepages do SAPO, não só em Portugal, mas também nos internacionais e acho que cumpriu bem o seu papel. Para mim foi uma óptima experiência e acho que consegui um bom resultado num estilo diferente do que estou habituado. Fiquei com vontade de fazer mais coisas deste género ou, talvez, de experimentar outros estilos completamente diferentes.
Acima de tudo, desenhar continua a ser uma das coisas que mais prazer me dá. Espero que gostem!
Não é particularmente fácil falar do que eu quero falar sem falar de imensas coisas de que não me apetece falar. Digamos portanto que é uma espécie de terreno minado, sendo que as minas estão mais ou menos assinaladas e eu posso saltitar por entre elas, não deixando no entanto de correr o risco de […]
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