Gatos

Publicado em , por Pedro Couto e Santos

Sou um gajo de gatos. Desde miúdo que o sou e continuo a ser. Recentemente, um gato em particular entrou na minha vida, na vida da minha famí­lia e ninguém lhe ficou indiferente. Um pequenito, nascido no campo, ali perto de Grândola, cuja mãe o trouxe, com os irmãos, para estarem seguros perto da casa dos meus sogros.

É um gato amarelo, felpudo e de patas largas, chamado Chewie – o nome foi daqueles que me saltou í  ideia e que colou imediatamente.

Há muitos, muitos anos, vivia no Algueirão e por lá andava um gato de rua, chamado Carlos Lopes. Não era bem o nosso gato, acho que éramos mais os humanos dele. Por essa altura, tive o meu primeiro gato, o Nuno e havia também um gatarrão que por lá andava, de original nome Snoopy.

Quando vivemos no Alentejo, em Mourão, tí­nhamos o Spock. O Spock foi atacado por um pastor alemão e “eutanasiado” í  paulada pela Dona Rosa. Eu tinha 6 ou 7 anos e ainda me lembro da cena – coisa simpática para um miúdo pequeno.

A ordem das coisas já está um pouco confusa na minha cabeça, mas se não me engano, no regresso ao Algueirão, havia a Panqueca, que teve dois gatinhos, a Mascarilha e o Gin Tónico (o meu pai chamava Gin Tónico a todos os bichos, se pudesse) e a Pantufa, adoptada pelos meus pais num dia de Banco no Hospital.

A Pantufa veio connosco para Almada e viria a viver 18 longos anos. Morreu í  minha frente, quando já não havia nada a fazer por ela. Então, veio a Michelle. Uma criatura minúscula e completamente parasitada por dentro e por fora, que encontrámos em cima da roda de um carro, uma noite, em Almada.

Tinha tantas pulgas e lombrigas que foi uma verdadeira batalha limpá-la. Há um ví­deo muito antigo, feito com uma daquelas camcorders gigantes, de várias pessoas da famí­lia a catar a gata, depositando as pulgas num alguidar cheio de água.

A Michelle viveu 20 anos! Morreu há pouco tempo, já na nossa actual casa e ainda viu nascer o Tiago e a Joana.

Em 1998 casei-me e fui viver com a Dalila. Connosco foram a Michelle, a Amarela e a Branca (sim, uma gata amarela e uma gata branca, que foram com a Dalila). A Branca não se adaptou bem na nossa casa e voltou para os meus sogros. Acabaria por morrer ainda relativamente nova, com um tumor. A Amarela viveu muitos anos, não me recordo exactamente quantos, uns 18.

Na nossa primeira casa, adoptámos a Scully, uma gatinha que nasceu nas traseiras do prédio e veio ter comigo um dia quando voltava do trabalho. Viveu 14 anos, que parece pouco, mas é, no fundo, a esperança média de vida de um gato.

No meio da rua, em Alfama, encontrámos a Ripley, atropelada. Infelizmente, embora tenha recuperado bastante, estava com uma pneumonia e tinha imunodeficiência e não sobreviveu.

No veterinário onde levávamos as gatas (e onde ainda vamos, quase 20 anos mais tarde), estava a certa altura uma banheira cheia de gatinhos que alguém tinha atirado para um contentor de lixo. Adoptámos o Coffee e a Cream, mas nem um nem outro resistiram mais do que dois ou três dias.

Na ida e vinda do veterinário para os tentar salvar, trouxémos uma gatinha já mais crescida, amarela, a Ginger. Uma gata cheia de energia, que estava a viver na nossa sala, antes de se adaptar í s outras. De um dia para o outro, a Ginger adoeceu e morreu em 24 horas.

Numa questão de dias, adoptámos três gatos que morreram em pouco tempo, apesar dos nossos cuidados. Determinados, voltámos ao veterinário, onde já sobravam poucos gatinhos na tal banheira (talvez fosse uma caixa, a memória já me falha). Um deles saltava, punha-se de pé e miava freneticamente.

Levámo-lo para casa e, no meio de tanta morte eu disse que se este sobrevivesse seria o Jones, como o gato do Alien, que, juntamente com a Ellen Ripley, é um dos únicos sobreviventes. E assim foi. O Jones foi alimentado a biberão por nós e agora trepa-nos para o colo, deita-se de costas e chucha na nossa roupa. Tem 13 anos.

Quando perdemos o nosso primeiro filho, Alex, em 2005, a Dalila, por tudo isto que eu já escrevi e também provavelmente por reacção, adoptou três gatos.

A Buffy e a Nikita estavam numa gaiola, numa loja de plantas e rações, para dar. E ela levou ambas para casa. O House, estava no meio da rua, todo escafiado, provavelmente atropelado. Também o levou para casa, tinha bacia partida, hemorragias diversas e uma infecção urinária. Tratámos dele e agora anda por aí­, com um andar esquisito, como o seu homónimo Dr. House, mas impecável.

Voltamos ao Chewie.

me_and_chewie

No verão, depois de pensarmos bastante, já apenas com quatro gatos cá em casa, decidimos ficar com o tal gatinho amarelo alentejano. Por tudo o que se percebe do texto acima, mas também muito porque os nossos filhos adoram os gatos e achámos que ia ser bestial para eles terem um gatinho bebé em casa, enquanto ainda são miúdos.

O Chewie é um gato a sério. É brincalhão, como é apanágio dos pequeninos, é temerário com os gatos mais velhos, como é esperado num animal territorial, ainda por cima macho, é paciente com os miúdos, que adoram andar com ele ao colo pela casa e é afectuoso com toda a gente, sempre de motor ligado, a dormir de barriga para o ar, ao pé de nós.

Desde dia 24 que o Chewie está internado com uma panleucopenia, no mesmo veterinário onde já fomos tantas vezes, com tantos gatos, por tantas razões. É uma doença fatal, com uma taxa de mortalidade muito elevada e cuja recuperação depende apenas dele. Sabemos que está a ser bem cuidado, os sintomas e as infecções secundárias estão a ser tratados, prevenidos e controlados, mas é apenas o corpo do bicho de cerca de quatro meses que tem que fazer o que puder para se manter vivo e rechaçar o ví­rus.

Cada dia que o Chewie sobrevive, é mais um pontinho a favor, é um ligeiro aumento na probabilidade que se safe. E a única coisa que esta famí­lia quer agora, é o nosso gatinho de volta.

Gostava de poder dizer, em breve, com a voz de um Harrisson Ford envelhecido: “Chewie, we’re home”

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Publicado em , por Pedro Couto e Santos

Não é particularmente fácil falar do que eu quero falar sem falar de imensas coisas de que não me apetece falar. Digamos portanto que é uma espécie de terreno minado, sendo que as minas estão mais ou menos assinaladas e eu posso saltitar por entre elas, não deixando no entanto de correr o risco de me desequilibrar e cair em cima de uma delas.

No iní­cio do mês de Outubro deixei de trabalhar no SAPO e pouco depois, deixei de ser funcionário da PT. Ao fim de 12 anos, demiti-me para aceitar uma nova oportunidade, noutra empresa (já lá vamos).

Doze anos de qualquer coisa é muito tempo de qualquer coisa. Doze anos de vida, de um emprego, de pessoas, de locais, de hábitos e rotinas é mesmo muito tempo. E precisamente por ser tanto tempo, não se pode definir de forma particularmente sintética.

Trabalhar no SAPO não foi uma coisa, foi muitas coisas, foi ser um gajo que fazia uns banners, gravava umas páginas do browser para fazer correcções no código (e tentava não ter muita comichão com isso), foi desenhar sites e aplicações, í­cones, logos e ilustrações, escrever código em barda, foi fazer lobby para que a equipa de design deixasse de estar no editorial e passasse para o técnico, foi ajudar as pessoas a integrar-se, a ter melhores oportunidades, a aprender coisas novas, foi fazer cenografia e decoração, desenhar o Codebits, fazer t-shirts e merchandising, foi até cozinhar nuclear tacos e fazer umas boas centenas de pessoas sofrer.

Foi uma série de outras coisas menos boas, como não podia deixar de ser, alguns conflitos com pessoas, frustração com projectos, cansaço, desilusões ocasionais e várias outras coisas que fazem parte de qualquer relação que se tenha na vida, seja pessoal ou profissional.

O SAPO era uma direcção da PT (e ainda é…), e como tal começou aos poucos a ser afectado pela crise que a empresa sofreu nos últimos dois anos. Apesar de termos uma cultura própria e uma espécie de barreira defensiva daquilo a que vulgarmente se chama a PT Profunda, não havia maneira de ficarmos incólumes ao que se passava naquilo que era, de facto, a nossa empresa.

Mas eu não vou aprofundar-me em pormenores obscenos sobre o que se passou e continua a passar na PT, porque não sou esse tipo de gajo e também porque quando eu senti que o ní­vel de conforto tinha descido o suficiente para mim, fiz o que achei que devia fazer e saí­. Também não me armo em herói, saí­ porque me surgiu uma excelente oportunidade na altura certa.

Enter Kwamecorp

kwamecorp

Numa série de coincidências simpáticas (em que o Facebook foi instrumental), re-encontrei-me com um velho amigo que já não via há anos. Bebemos umas imperiais e conversámos sobre o passado e o presente, o trabalho, as empresas e as famí­lias. Ele, designer, actualmente na Kwamecorp, um colectivo de designers e engenheiros com escritórios em várias cidades, equipa em Lisboa e vários projectos e clientes de peso; eu, na PT com um outlook algo cinzento.

Apenas alguns dias depois, surgiu o convite para fazer umas entrevistas. Já tendo recusado algumas oportunidades ao longo dos anos, precisamente por estar bem onde estava, desta vez senti que era algo completamente diferente: não só eu já não me sentia bem onde estava, como a KC me parecia uma empresa de excepção para trabalhar. Fiz as entrevistas, que correram muito bem e o resto é um bocadinho desta história que ainda está no iní­cio.

No dia 2 de Novembro comecei a trabalhar na Kwamecorp. O meu primeiro dia começou í s 4 da manhã, hora a que acordei para me preparar, pegar na mala e partir para o aeroporto de Lisboa. Viagem para Munique, depois para Zurique, uma semana de user testing de um projecto que depois seguiu, connosco, para Palo Alto, para uma semana de sessões de trabalho, wrap-up e entrega. Passei duas semanas em viagem, a absorver o novo trabalho, aprender nova metodologia, conhecer novos colegas e a ajudar no que podia.

Foi a chamada entrada a pés juntos.

Entretanto já estou em Lisboa, a trabalhar no escritório da Rua Garrett, num espaço porreiro, cheio de pessoas completamente doidas. Mesmo o meu tipo. O trabalho é bestial, a cultura da empresa é genuí­na e infecciosa e acordo todas as manhãs com vontade de vir para o trabalho. Com jet lag, todo fornicado dos cornos, mas com vontade de vir para o trabalho.

Com 42 anos e depois de 12 anos na mesma empresa, esta foi uma mudança significativa na minha vida profissional e agora que a abracei, tudo parece renovado, do trabalho no dia a dia, até í  simples deslocação, com o regresso í s viagens de cacilheiro e ao ambiente do Chiado.

A vários ní­veis, agora parece-me claro que estava mesmo a precisar de algo assim. Não sei exactamente o que vai acontecer a seguir, mas sei que vou estar com atenção para ver. Aqui fica ao iní­cio de um novo capí­tulo e í  curiosidade sobre o que se passará nos próximos 12 anos.

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Sou um gajo de gatos. Desde miúdo que o sou e continuo a ser. Recentemente, um gato em particular entrou na minha vida, na vida da minha famí­lia e ninguém lhe ficou indiferente. Um pequenito, nascido no campo, ali perto de Grândola, cuja mãe o trouxe, com os irmãos, para estarem seguros perto da casa […]

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