Este blog tem quatorze anos. Catorze é demasiado simplista, são quatorze e este post até já vem tarde, porque foi no dia 30 de Março que se comemorou a efeméride.
É verdade que já não escrevo tanto como antigamente e que também, já não escrevo de forma tão pessoal, mas o Macacos Sem Galho mantém-se aqui como um velho amigo com quem se fala uma vez por ano e parece que não passou tempo nenhum.
Tem-se falado muito do rapaz que grita com sotaque do norte sobre trabalhar 126 horas por dia. Parece que foi chamado ao dever cívico pelo mais energúmeno dos nossos governantes o que, de facto, não espanta ninguém. Estão bem um para o outro, são ambos enormes armazéns dessa matéria tão fértil que com os anglófonos aprendemos a chamar de trampa de boi.
Mas toda a gente tem o direito de defender as suas ideias. O Relvas tem o direito de cantar a Grândola, embora conviesse aprender a letra e o rapaz que usa sapatilhas e já esteve razoavelmente perto do Zuckerberg, tem o direito de dizer que temos que trabalhar muito, muitas horas, fazendo a mesma coisa 200 vezes até sair perfeito.
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Eu, que já apalpei o rabo í Nina Hartley (mesmo), acho que tenho o direito de defender o meu ponto de vista que é exactamente o oposto. Trabalhar é uma merda. Trabalhar é cansativo e aborrecido. Fazer a mesma coisa 200 vezes até sair bem é imbecil e sinal de falta de organização e de conhecimento da área em que se está a trabalhar.
Nós devemos é maravilhar-nos. Devemos ou trabalhar o mínimo indispensável para ficarmos com rendimento e tempo livre para irmos viver o resto da nossa vida ou arranjarmos um trabalho que nos dê prazer fazer e se confunda ou complemente com naturalidade essa vida.
Devemos ir para o trabalho para fazer coisas para nós e para as pessoas para quem trabalhamos, sejam clientes ou colegas ou mesmo para o patrão. E não para fazer horas, para queimar tempo, para podermos dizer que estivemos 22 horas no escritório todos os dias desta semana.
E o que produzimos? Não interessa? Não só interessa… é o que interessa.
Mas não me espanta que o Governo tenha ido buscar o macaquinho cujo sotaque parece fazer parte da actuação: este é o Governo que acha que é eliminando feriados e dias de férias que se produz mais, num país onde as pessoas passam mais horas no trabalho do que no resto da Europa e no entanto produzem menos do que a média.
Ou fazemos algo de que nos orgulhamos e nos dá prazer ou fazemos algo só para ganhar dinheiro para irmos buscar o prazer a outro lado. O prazer, o lazer, a aprendizagem, o amor, o contacto com de quem gostamos, a descoberta de sítios, sejam locais ou mundos imaginados – estes devem ser alguns de muitos objectivos das pessoas.
Motivar, só por motivar é idiota. Falar muito e fazer pouco é inútil. Todo o sistema em cima do qual a nossa sociedade está montada, está podre. Não estamos a evoluir no sentido de uma libertação das pessoas, da elevação do seu potencial humano, estamos a moer metal e a ficar parados, estamos a fazer a mesma coisa, vezes sem conta e a esperar resultados diferentes. Arranjamos rapazolas cuja vida é ganhar dinheiro a gritar para audiências e pomo-los a gritar para audiências, na esperança de que se levantem e vão trabalhar para pagar impostos, para alimentar a máquina, por podre que esteja, porque toda a gente deve cada vez mais dinheiro a toda a gente e precisamos mesmo de motivar as pessoas a matar-se a trabalhar, sem olhar a quê, nem a quem, para “alavancar sinergias e gerar riqueza”, para voltar a alimentar a máquina.
E não se educam os povos e não se libertam as pessoas e não se valoriza aquilo que realmente faz de nós seres humanos e não macacos de gravata, aos guinchos uns para os outros, a ver quem faz mais horas, quem dorme menos, quem mais ignora a família e os amigos para obter um sucesso vácuo e dinheiro para exibir aos outros macacos.
Este blog tem quatorze anos. Catorze é demasiado simplista, são quatorze e este post até já vem tarde, porque foi no dia 30 de Março que se comemorou a efeméride. É verdade que já não escrevo tanto como antigamente e que também, já não escrevo de forma tão pessoal, mas o Macacos Sem Galho mantém-se […]
Tem-se falado muito do rapaz que grita com sotaque do norte sobre trabalhar 126 horas por dia. Parece que foi chamado ao dever cívico pelo mais energúmeno dos nossos governantes o que, de facto, não espanta ninguém. Estão bem um para o outro, são ambos enormes armazéns dessa matéria tão fértil que com os anglófonos […]