Desacordo ortográfico
Publicado em , por Pedro Couto e Santos
í ummas bí´uas semmanas que hando pâra escrevêr sí´bre o “nouvo” ací´rdo ourtográficoda língüa portuguêza, cí´mo dízem os pacótes de açí¹cár: oje é o dia!
Châma-se í nóssa lingüa, a lingüa de Cí mões, mas noz não falâmos a lingüa de Cí mões: falâmos umma versão modificáda déssa mêsma lingüa. O Cí mões não escrevia “co”, em vêz de “com”; “üa”, em vêz de “uma” e “mui”, em vêz de “muito”?
Bí´m, í¨ verdáde que falâmos muito máis a lingüa de Cí mões do que a de, digâmos, Gil Vicente. Esse gájo sim, éra um ganda maluco.
Mas a língua parece ser mesmo assim: antigamente escrevia-se “Marquez” e agora escreve-se “Marquês”; mas ainda existem pessoas que aprenderam a escrever “Marquez” e se insurgem quando, na carruagem do metro, o sinal luminoso indica que a próxima estação é “Marquês de Pombal”.
Bom, verdade seja dita, o dito sinal não tem caracteres acentuados, pelo que a paragem é, efectivamente “Marques de Pombal”, o que é uma coisa completamente diferente de Marquês.
Mas porque muda a língua?
Não faço a mais pequena ideia, para ser sincero. Não sou linguista e não me apetece minimamente pesquisar o assunto. Mas português sou e portanto posso dar a minha opinião como se da verdade absoluta se tratasse e ignorar a História, Literatura e outras disciplinas que possam ou não ser chamadas ao assunto.
Portanto, eu acho que a nossa língua evoluiu, ao longo dos séculos, de Gil Vicente para Camões, para nós, com o objectivo de se afastar dessa escarreta que é o castelhano.
Com o passar do tempo, o Português foi-se refinando e ganhando complexidade e tornando-se diferente do espanhol; ganhou uma identidade e riquezas próprias e dificilmente igualáveis por qualquer outra língua humana.
A nossa língua é bestial: flexível, cheia de sons diferentes que nos permite aprender outras línguas com relativa facilidade.
Os espanhóis têm apenas cinco sons de vogal: á, é, í, ó, ú. São as cinco vogais, todas acentuadas. Para um português se fazer entender em Badajoz, bástá qué acéntúé tódás lás vógalés qué díz e pronto: a espanholada entende.
Agora experimentem usar a nossa variedade de sons: mais nasalado, aberto, fechado, acentuado, arrastado: são três ou quatro sons para cada vogal, nas calmas. Esta variedade torna-nos flexíveis, permite-nos aprender pronúncias e dá cor í nossa língua.
Claro que o acordo ortográfico não tem nada a ver com a maneira como falamos, mas apenas com a maneira como escrevemos. No entanto o meu caso tem simplesmente a ver com isto: se andamos há séculos a fazer evoluir a nossa língua para que ganhe identidade própria e se afaste da raiz hispânica de onde nasceu… porque raio vamos agora adoptar um acordo que obriga a que o país de origem da língua se aproxime das suas ex-colónias?
Se, no nosso país, escrevemos “acção”, porque é que vamos passar a escrever “ação”? Não deveríamos preservar a identidade da língua, obrigando os restantes países de expressão portuguesa a melhorarem a sua grafia incorrecta?
Dizem que isto expandirá a língua, a tornará mais global. Não vejo como: as diferenças de pronúncia são vastamente superiores í s diferenças de grafia e não me parece que passar a escrever “ótimo”, adotar” ou “fação” ajude de forma alguma a nossa língua a ser mais respeitada no contexto internacional.
Assim como não vejo a necessidade de escrever “dossiê”, “lóbi” e “stresse”.
Como argumento final, resta-me aquilo que mais me diz: o lado visual. Visualmente, a nova grafia é um nojo; as palavras parecem incompletas, coxas, como se fossem cair para o lado a todo o momento. Além de que parece erradas e geram confusão com outras palavras.
Por exemplo, sou quase capaz de apostar que alguns de vocês, ao lerem “fação”, acima, pensaram que eu tinha escrito mal “façam”, mas não, apenas escrevi “facção” de acordo com as novas regras. Mas a verdade é que “fação” parece “façam”, mal escrito. E “receção”, parece “recessão” mal escrito e não “recepção” de acordo com as novas regras.
O acordo não traz vantagens, irrita uma montanha de portugueses, induz em erro e parece ser apenas uma modificação da nossa grafia, sem significativa (se alguma), evolução. Para que serve?
Bom, para começar deve dar um jeitaço para vender livros escolares totalmente re-escritos. Mas tirando isso, não serve para a ponta de um corno. E se não bastasse tudo isto, o acordo original, de 91, foi assinado pela maior incongruência governativa que o nosso país já teve: Pedro Santana Lopes como Ministro da Cultura.
O Macacos sem galho declara-se assim, oficialmente, fora do acordo ortográfico da língua Portuguesa.
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