Publicado em , por Pedro Couto e Santos
A não-discriminação é uma puta. É deslavada e dá-se a toda a gente. Mas como é só uma, não pode dar para todos e depende sempre de quem a está a usar. Digo isto, porque li um post da Jonas sobre o assunto e, já que ela previa um pico em posts sobre o assunto, aqui estou para satisfazer os seus desejos.
Lamentavelmente, para a Jonas, o meu blog não é dos que lhe interessam em termos de KPIs, mas não faz mal, cá estou a fazer a minha parte.
O que me chamou mais a atenção, nem foi o post, sobre a discussão para breve, na AR, do casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas um comentário, ou melhor, resposta a comentário, da própria autora do post.
Dizia o Gus que acha que a sexualidade das pessoas não devia fazer a mínima diferença nas suas relações com os outros e responde-lhe a Jonas que de facto, não.
Mas depois diz algo que me deixou curioso e vou citar:
“Se eu quiser reunir um grupo de amigos para beber uns copos lá em casa, vou convidar pessoas que gostem do mesmo tipo de música que eu. Nessa perspectiva os gostos musicais são uma forma de selecção. O mesmo para a comida. Se vou dar um jantar de cozido í portuguesa, não convido vegetarianos.
Para qualquer um destes eventos os gostos que descreveste são fundamentais e dão direito a exclusão.”
Eu bem dizia. A não-discriminaçao não dá para todos e está correntemente a ser usada, pelos defensores heterossexuais da sexualidade dos homossexuais (dos quais, aposto, até têm amigos que são). Para a Jonas, neste comentário – e tenho a certeza que sem qualquer maldade, porque a conheço – no seguimento de dizer que discriminar por sexualidade é algo que não faz e em que nem sequer pensa, confessa que se for por regime alimentar ou gosto musical, já discrimina.
Ainda há pouco tempo organizei um churrasco de febras e chouriço e uma amiga comeu espetadas de legumes. Não foi o vegetarianismo dela que a impediu de se juntar a todos os carnívoros ali presentes.
E o gosto em música? Bom, se for uma festa de nerds, todos sentados em silêncio a ouvir um álbum de Tool enquanto se masturbam, compreendo, agora ser fundamental e com “direito de exclusão” gostar de certo tipo de música para ter direito a partilhar uma festarola, parece-me, novamente, tão discriminatório como dizer: “pretos cá em casa? nada contra eles, mas isto é uma festa de brancos”.
O que me parece mais curioso, é que a Jonas não diz nada disto com nenhum tom agressivo ou discriminatório. Eu sei que ela não é preconceituosa neste aspecto (sê-lo-í noutras coisas, todos somos), e que o seu comentário sobre o “direito a exclusão” não foi dito com más intenções.
Mas é precisamente aí que quero chegar: as pessoas gostam muito de subir para caixas de sabão e bradar a bom som que são anti-discriminação! Mas de preferência, anti-a-discriminação-que-estiver-na-moda.
É que, no fundo, todos discriminamos alguém ou algum grupo, alguma vez na nossa vida. Admitam-no, vão ver que se sentem muito melhor. A nossa sociedade anda a ensinar-nos a sentir culpa sempre que discriminamos alguém e a tentar forçar-nos a gostar de toda a gente. O mundo não é assim… as pessoas não são assim!
Parem de deixar que alguém vos diga que bandeiras devem hastear e decidam por vós próprios. A vida não é longa o suficiente para amarmos toda a gente e o ser humano é discriminatório por natureza: é a protecção da tribo a funcionar. Se é igual a mim, estou seguro, se é diferente, devo estar alerta. É um instinto e não é a correcção política que o vai mudar.
Se não gostam de homossexuais, imigrantes ou… vegetarianos, paciência. Seria bom que conseguissem olhar para além disso e ver apenas pessoas, mas vai sempre haver um grupo qualquer com o qual não conseguem fazer isso. Talvez seja da vossa educação não gostar de chineses, talvez venha de uma qualquer má recordação de infância não tolerar ciganos ou talvez seja da vossa cultura, abominar lésbicas, deixem-se de merdas e admitam-no a vocês mesmos. Desde que deixem as outras pessoas viver as suas vidas, ninguém vos obriga a gostar de toda a gente.
E Jonas, vá lá, deixa os teus amigos vegetarianos aparecer no dia do cozido e oferece-lhes uma salada de grão com cebolinha cortada fina, salsa, azeite e vinagre balsâmico e umas malaguetas picadinhas para dar aquele “oomph” extra. Eles vão ter o que comer e assim não tens que excluir ninguém.
Ou então… caga nesse papa-ervas!
hey! adoro este assunto!
olha, creio que o exemplo que citas – e desmontas – só peca por ser demasiado específico e em nada fere certamente a coerência que questionas
é que organizar e ser host de uma cena em nossa casa dá-nos o direito, até mesmo a obrigação, de fazer essa selecção… palavra infeliz, chama-lhe antes adequação
eu se quiser organizar uma festa de música aos berros não vou convindar os bébés filhos dos meus amigos… os pais podem vir, claro, se conseguirem… estarei a descriminar os putos?
aliás adoro fazer festas só mesmo para filhos e respectivos, porque não? e nessas convido apenas 1 ou 2 casais em branco para me poder dedicar melhor í evangelização dos mesmos.. estarei a descriminar tios e tias?
(…) Bom, se for uma festa de nerds, todos sentados em silêncio a ouvir um álbum de Tool enquanto se masturbam, compreendo (…)
lindo! gargalhada da noite!
Bom texto.
Uns vivem nuns aquários mais pequenos, outros nuns tanques mais âmplos, mas há sempre um limite. Todos temos o nosso e não há nada a fazer. Uns embarram com os gays, outros com os pretos, outros com outras religiões. Ou a falta delas.
Todos temos um muro, conhecê-lo é importante, negá-lo é burrice.
LOL
Na volta expliquei-me mal.
O que eu queria dizer é que há características dos meus amigos que são públicas, e que conheço, que gosto de conhecer e que podem servir como factor de decisão. Se eu for ao cinema com um grupo, ver um flme de ficção científica, não convido a minha irmã. Se a minha irmã for ao cinema ver um filme esquizitóide, não me convida a mim. O factor sexo/orientação sexual, não entra nesta equação de selecção. Há casos em que a orientação sexual é um factor fundamental de inclusão/exclusão. Se eu fosse solteira e quisesse arranjar um namorado, a orientação sexual de um potencial namorado, seria determinante :)
Sou preconceituosa em relação a muitas coisas. Mulheres ao volante, gente burra, aduladores graxistas, pessoas que dão erros de ortografia, e muitas mais que não me recordo agora. Também se aprende com tempo a deixar de ter determinados preconceitos. Eu era muito preconceituosa com pessoas que se movimentam numa ala política mais í direita, e perdi (parcialmente) esse preconceito com uma maior convivência com a espécie :)
Por último, não sei fazer cozido í portuguesa (embora adore) e o único vegetariano que conheço é o Defim :)
Obrigado pelos vossos comentários, estava um pouco na dúvida se seriam desta natureza ou simplesmente insultos.
Jonas, claro que percebi o teu comentário, mas descontextualizado, serviu como ponta de partida para uma coisa que já andava para escrever há uns tempos.
Óptimo, é bom saber que, de vez em quando, o que escrevo tem alguma utilidade para além da minha terapia pessoal :)
Sobre este cadente tema da discriminação, eu – que todos os dias convivo com todo esses que vós discrimineis… – convido a ler o meu texto sobre os coxos, esse orgulho nacional, em http://www.coiso.net
Um bocadinho descontextualizado, este meu comentário.
Não é curioso, Macaco, que tu hoje tenhas subscrito um blog por causa dos comentários a um post do meu blog, e eu tenha subscrito um blog por causa dos comentários a um post no teu blog?
:)
Que blog subscreveste?
O Coiso.
Ontem investi no mês de Setembro. Hoje (e nos próximos dias) vou investir no arquivo. Adoro descobrir um Blog com um arquivo grande. Vasculho tudo :)
Ah, o blog do meu pai, portanto. O Coiso está quase a fazer 9 anos, tens aí muito por vasculhar :-)
Eu sei, adoro :)
Sou muito bem mandada. O teu pai convidou, e eu decidi aceitar o convite.
Agora vou vasculhar nos armários da casa-de-banho, e na despensa, e naqueles sítios mais recí´nditos onde os donos da casa normalmente atafulham a tralha, quando estão í espera de visitas (sim, isto é o que eu faço).
Hum… claramente não conheces o meu pai, nunca verás casa de banho mais bem organizada na tua vida! :-)
Concordo que todos discriminamos nisto ou naquilo, mas por uma questão de socialização e educação e não por “natureza humana”. A prova disso é que as discriminações são contextuais, diferentes de lugar para lugar.
Além do mais, mesmo sabendo que não gosto de espanhóis não sou capaz de defender uma lei anti-imigração que discrimine os espanhóis. Faz toda a diferença.
Sim.
Eu falo das nossas discriminações privadas, como eu disse: “Desde que deixem as outras pessoas viver as suas vidas, ninguém vos obriga a gostar de toda a gente.”